Licença maternidade e o ambiente corporativo: O que a lei garante e a realidade insiste em negar?
- Priscila Lourenço

- 23 de out.
- 3 min de leitura

A luta histórica das mulheres por igualdade de direitos encontra no ambiente de trabalho um de seus maiores desafios. Estatisticamente, mulheres ainda ocupam menos cargos de liderança e seus salários, em geral, não se equiparam aos dos homens. A maternidade, em particular, é frequentemente vista por algumas empresas como uma barreira à produtividade, o que impacta decisões de contratação e promoção, reforçando práticas discriminatórias sutis, mas persistentes.
Embora a legislação brasileira ofereça um robusto conjunto de normas para proteger a mulher gestante e lactante, o retorno ao trabalho após a licença-maternidade é, muitas vezes, marcado por dificuldades. O que deveria ser um momento de readaptação e acolhimento pode se transformar em um período de assédio, com comentários preconceituosos e esvaziamento de funções, culminando em interrupções de carreira e, em casos extremos, na demissão. Confira a seguir, os principais direitos que a legislação e a jurisprudência garantem às mães trabalhadoras.
Direitos Fundamentais da Gestante e Lactante
A legislação trabalhista brasileira assegura um conjunto de direitos essenciais para proteger a maternidade, a dignidade e a estabilidade profissional da mulher.
Licença-Maternidade: Garante 120 dias de afastamento, sem prejuízo do emprego e do salário (Art. 7º, XVIII, da Constituição Federal).
Estabilidade Provisória: Assegura o emprego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, vedando a dispensa arbitrária ou sem justa causa (Art. 10, II, "b", do ADCT). A jurisprudência, inclusive, estende essa proteção a contratos por prazo determinado e de trabalho intermitente, conforme reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 542).
Garantia de Retorno à Função: Ao retornar da licença, a trabalhadora tem o direito de ser readmitida na mesma função que exercia anteriormente, com salário e jornada equivalentes. Qualquer alteração que lhe seja prejudicial pode ser considerada uma alteração contratual lesiva, nos termos do art. 468 da CLT.
Pausas para Amamentação: A mulher tem direito a dois descansos especiais de meia hora cada um durante a jornada de trabalho para amamentar o filho, até que este complete seis meses de idade (Art. 396 da CLT). A não concessão desses intervalos pode gerar o direito ao pagamento de horas extras, como entende o Tribunal Superior do Trabalho — TST - AIRR: 0011037-71.2013.5.03.0030.
O Assédio Moral no Retorno da Licença-Maternidade
O retorno ao trabalho pode ser um momento de grande vulnerabilidade. Práticas como o esvaziamento de funções ou a chamada "ociosidade forçada" são reconhecidas pela Justiça do Trabalho como formas de assédio moral, pois atentam contra a dignidade da trabalhadora. Contudo, a jurisprudência é firme ao proteger a empregada nessas situações.
O Tribunal Superior do Trabalho reconheceu que colocar a empregada em ociosidade forçada após o retorno da licença-maternidade viola seu direito à dignidade e gera o dever de indenizá-la por danos morais. O TRT da 4ª Região por exemplo, decidiu que inviabilizar o retorno da trabalhadora à sua função de coordenação após a licença-maternidade é uma prática discriminatória, que reforça a ideia de que a maternidade é um obstáculo à progressão na carreira, justificando a condenação por danos morais.
Consequências da Dispensa Discriminatória
A dispensa de uma empregada logo após o término do período de estabilidade é uma prática que pode ser considerada discriminatória, especialmente se a empresa demonstra um padrão de desligar funcionárias que se tornam mães. A Lei nº 9.029/95 proíbe práticas discriminatórias nas relações de trabalho.
Quando a dispensa discriminatória é comprovada, as consequências para o empregador são severas:
Reintegração da Empregada: A trabalhadora tem o direito de ser reintegrada ao seu posto, com o ressarcimento integral de todo o período de afastamento.
Indenização em Dobro: Alternativamente, a empregada pode optar por não ser reintegrada, tendo o direito de receber, além das verbas rescisórias, uma indenização correspondente ao dobro da remuneração do período de afastamento.
Podemos concluir, que combater a desigualdade de gênero no ambiente profissional vai além do simples cumprimento das normas legais. É preciso transformar a cultura corporativa, reconhecendo a maternidade como um aspecto legítimo e natural da vida de muitas mulheres, e não como um empecilho em suas carreiras.
Assegurar que as trabalhadoras tenham seus direitos plenamente respeitados significa fortalecer a justiça social, a igualdade e a dignidade, princípios que devem nortear todas as relações de trabalho. A estabilidade é uma conquista legal, e o assédio moral, uma conduta que gera responsabilidade. Conhecimento e informação são ferramentas essenciais para promover respeito e equidade.
Escrito por:

Priscila Rodrigues Lourenço é advogada inscrita na OAB/SP 358.424 e parceira do escritório, com mais de uma década de experiência com advocacia trabalhista e um forte engajamento institucional junto à 127ª Subseção da OAB/SP como Secretária-Geral (2025-2027), Secretária Adjunta (2022-2024) Presidente da Comissão dos Advogados de Ipuã (2025)





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